Publico hoje aqui em meu blog artigo/entrevista com Raúl Fonseca, colega da Venezuela, sobre o referendo que ocorreu em seu país no domingo passado. O texto foi publicado no Jornal Dois Irmãos de sexta-feira, 20.
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Venezuela: "há liberdade de expressão mas todos se sentem vigiados"
Uma das maiores vantagens de se estar aqui em Washington com jovens de tantos países diferentes é a convivência e a troca de experiências. São argentinos, peruanos, equatorianos, colombianos, bolivianos, brasileiros, espanhóis, mexicanos, chilenos, um português, um venezuelando, uma panamenha e uma nicaragüense. Como cada um está ligado mais especificamente no que está acontecendo em seu país pela internet, e todos sabemos mais ou menos o que está acontecendo em toda a América Latina por causa do noticiário internacional de nossos jornais locais, é muito interessante poder imediatamente comentar as últimas notícias entre nós.
Não preciso dizer que, durante a semana, a notícia mais importante da região foi a vitória de Chávez no referendo que houve domingo na Venezuela. Raúl Strauss, administrador de empresas boliviano, disse-me que está preocupado. “Quando Chávez consegue uma aprovação como essa, logo a idéia chega à Bolívia”, disse-me na segunda-feira. Dito e feito. Na terça-feira já lia eu na edição online da Zero Hora que o MAS, partido do presidente da Bolívia, Evo Morales, também queria propor uma emenda à Constituição na Bolívia. O engenheiro José Alvaró Benages, que divide apartamento comigo em Arlington, na Virginia (a cidade fica do outro lado do Rio Potomac, que separa o Estado da Virgínia do Distrito de Columbia, onde fica Washington), também demonstrou preocupação.
Aproveitei o momento para fazer uma rápida entrevista com Raúl Fonseca, 30 anos, administrador de empresas e nosso único colega Venezuelano.
Marcel - A vitória de Chávez no domingo é reflexo de quê?
Raúl Fonseca – Falta consciência e compromisso dos Venezuelanos. A diferença foi de mais de um milhão de votos, apesar de ter aumentado o voto no não em relação ao último referendo (no qual o não havia ganho, há dois anos). É preciso que os esclarecidos levem mais a sério seu direito a voto, que não é obrigatório na Venezuela.
Como Chávez chegou ao poder?
A população queria rechaçar os 40 anos de corrupção que havia nos governos anteriores, em que governava a elite, pessoas mais educadas e esclarecidas.
E não há corrupção agora?
Comprovadamente há muito mais, mas muitos chavistas pensam, “já que roubaram tanto antes, agora é a nossa vez de roubar”.
Chávez não investiga a corrupção?
Ele diz que sim, que é uma herança que recebeu do passado, mas nunca demite ministros comprovadamente corruptos. A corrupção está mais institucionalizada e ele está conseguindo tornar a regulação inexistente.
Qual a estratégia eleitoral de Chávez?
Dividir a população.
Como assim?
Hoje a identidade é muito mais entre pobres e probres e entre ricos e ricos. É uma forma segura de conquistar votos, separando a sociedade em classes para identificar melhor o inimigo.
E a liberdade?
Está constantemente atacada. Há liberdade de expressão, mas todos se sentem vigiados.
E a oposição a Chávez?
Cometeu muitos erros, silenciou-se e está jogando o jogo dele ao dividir a sociedade entre pró- e antichavistas. Apesar de o processo do referendo ser frauduleno, perderam a oportunidade de demonstrar que Chávez é vulnerável e de mobilizar a sociedade civil para votar contra a reeleição ilimitada. O que mais me preocupa é que, com ou sem reeleição, o sistema que Chávez implantou na Venezuela tenha tanto apoio. Deveríamos ter demonstrado que somos nós, defensores da democracia e da liberdade, a maioria.
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